A reportagem é de X.M. Del Caño, publicada no jornal Faro de Vigo, 15-08-2010. A tradução é de Benno Dischinger.
Eis a entrevista.
Como é o processo para eleger o ministro superior dos franciscanos?
Quando há capítulo geral, a cada seis anos, as bases elegem seus próprios candidatos mediante votação secreta e os enviam a Roma. Depois se elabora o curriculum vitae dos dez primeiros que se envia às províncias. De modo que, quando os provinciais chegam a capítulo geral eletivo, já sabem que nomes entram em questão, mas isso não tem nenhuma validez jurídica. O capítulo pode eleger qualquer outro frade que não esteja nessa lista. O capítulo vota e dessa votação sai o ministro geral.
Onde se realizou o último processo?
A votação se fez em Assis. Nós celebramos os capítulos em lugares distintos, porém ultimamente realizamos vários em Assis, porque é o lugar no qual nascemos. Para nós, Assis é sempre um lugar particular.
Onde está a sede central da Ordem?
O centro da Ordem, a Cúria Gera, como a chamamos, está em Roma. Em Assis temos várias casas e os principais santuários que recordam a personalidade de São Francisco.
A casa central dos Franciscanos se encontra perto do Vaticano?
Bem pertinho, da porta de nossa cúria generalícia até a porta de São Pedro a uns cinco minutos a pé.
Como vão as relações da congregação com a Santa Sé?
Posso dizer-lhe que nossa relação com a Santa Sé é muito fraterna, muito cordial, de muita proximidade. E, todas as vezes que tive a felicidade de encontrar-me com o Santo Padre, com o Papa, antes João Paulo II, agora Bento XVI, tem sido para mim uma experiência muito formosa e realmente muito consoladora.
Quantos papas conheceu?
Conheci Paulo VI e João Paulo I, estava precisamente em Roma quando tive a dita de vê-lo; sem embargo, só tive relação pessoal com João Paulo II e agora com Bento XVI.
João Paulo II e Bento XVI são dois mundos distintos.
Certamente, o Papa João Paulo II é um homem midiático. Ele amava a multidão. Ele amava o contato direito com o povo. Era um pastor. João Paulo II era um grande pároco. Bento XVI poderia parecer muito mais reservado, mas é um homem que tem um diálogo muito fraterno e muito próximo. No diálogo pessoal, Bento XVI parece outra pessoa. È muito simples. Por isso creio que os dois papas se complementam e ao mesmo tempo há uma continuidade que vai além do que exteriormente poderia parecer.
Bento XVI se destaca por sua faceta intelectual.
Não resta dúvida, Bento XVI é um grande intelectual, um homem de formação muito elevada, basta ver seus escritos. Certa ocasião, num programa da televisão italiana, perguntaram a uma senhora anciã por que ia todos os domingos escutar o Papa na oração do Ângelus, e ela disse: “Me agrada ouvir como fala de Jesus”. Eu admiro muito Bento XVI, porque sabe conjugar muito bem a profundidade teológica, - pois é um grande teólogo, - com a simplicidade da exposição. Ninguém poderá dizer que não entende Bento XVI, porque ele se põe a um nível que pode ser entendido por todo9s. Portanto, além de ser um grande teólogo é um grande pastor.
O que resta da antiga rivalidade que havia entre distintas ordens religiosas?
Há uma organização, que é a Reunião de Superiores Gerais, onde nos reunimos duas vezes ao ano, durante uma semana, em assembléia plenária e a relação é muito cordial. As disputas, diferenças e divisões que pode ter havido no passado, na atualidade não existem.
São freqüentes os seus encontros com o Papa?
Eu encontrei o Papa muitas vezes e, quando há algum tema, peço audiência. O Santo Padre me tem concedido diversas audiências.
Que medidas pensa impulsionar a partir da cúpula da Ordem dos franciscanos?
Em primeiro lugar, as vocações. Para mim é a prioridade absoluta. Vamos trabalhar muito pela evangelização da juventude e pelas vocações. Em segundo lugar, o diálogo com a cultura atual. Para isso, temos que seguir promovendo a formação intelectual de todos os frades. A Ordem franciscana teve um grande papel na Idade Média e queremos que o siga tendo nesta era pós-moderna. E, para isso necessitamos formar-nos bem intelectualmente. A terceira prioridade é o espírito missionário. Queremos continuar sendo uma ordem missionária. Por isso, em meu mandato anterior, abrimo-nos a quatro países a mais onde ainda não estávamos atuando, sobretudo na África e na Ásia. E agora vamos abrir uma presença em Gana (África), onde ainda não estamos, e em Laos (Ásia).
Há países em que o missionário arrisca a vida?
Há sacerdotes que estão arriscando a vida na Índia, no Paquistão e Sudão, entre outros. Faz muito pouco, alguns irmãos europeus se ofereceram a mim para ir viver no Iraque e no Irã. Eu, é claro, não dei permissão nestes momentos, porém estamos pensando em abrir-nos a esses países e à Coreia do Norte, onde temos um frade.
Qual é o peso da província de Ourense e da Galícia na Ordem dos franciscanos?
A Galícia sempre foi muito importante na Ordem Franciscana, porque São Francisco veio a Santiago em 1214, como peregrino a Compostela, e desde 1222, quando ainda vivia São Francisco, já há uma presença em Santiago que, em seguida, se estendeu às principais cidades e localidades da Galícia. Embora com a Desamortização [sujeição ao Direito Comum, ndt], em 1835, tenham desaparecido muitas presenças, pouco mais tarde se recuperaram. Precisamente em Ourense, onde está hoje o Seminário Menor, nasceu a província de Santiago que teve importância muito grande por seu uma província missioneira, sobretudo na Terra Santa, em Marrocos e na Venezuela. A Ordem Franciscana deve muito a Ourense.
Sua presença é humilde.
Digo sempre que tenho três títulos honoríficos e posso acrescentar um quarto. O primeiro é que sou filho de agricultores. Meu pai se chama Angel e minha mãe, que faleceu há 16 anos, se chamava Célia. Eu nasci no campo, e quando vinha em férias ajudava na sega da erva, na colheita do centeio, do trigo e na colheita da batata. O segundo título é que sou filho de emigrantes. Meus pais, sendo eu muito pequeno, emigraram à Alemanha, em 1966, e logo à Suíça. Às vezes eu ia de férias à Suíça, porque meus pais não podiam vir para cá. Sempre me impressionou a limpeza das ruas e aquele verde forte que caracteriza a zona de Zurique onde estavam meus pais, trabalhando num restaurante italiano. Meu terceiro título é ser franciscano. Estou profundamente enamorado de minha própria vocação. Creio que é mais belo ter sido chamado a esta vida franciscana. São Francisco continua sendo muito atual porque ele pregou e vivenciou certos valores dos quais tem muita necessidade a sociedade atual, como o são a fraternidade, a simplicidade, a proximidade aos demais, particularmente às pessoas mais pobres.
Qual é seu quarto título?
Meu quarto título é ser galego. Amo muito minha terra. Já levo 13 anos seguidos fora da Galícia, passados em Roma. Antes disso, estive cinco anos em Jerusalém e mais 3 em Roma como estudante. Passei, portanto, quase 22 anos fora de minha terra. Sem embargo, sempre que posso venho à minha terra, onde procuro desfrutar e descanso com minha família. Por isso, passo as férias aqui em Lodoselo.
Em que ano se incorporou aos franciscanos?
Eu me incorporei à Ordem muito jovem, em 1971. Como franciscano, estive cinco anos em Jerusalém, estudando línguas orientais, depois passei a Roma, onde continuei com as línguas orientais e a Bíblia. Trabalhei durante cinco anos como professor das Sagradas Escrituras, primeiro no Seminário Maior São José de Vigo e depois no Instituto Teológico de Santiago de Compostela. Em 1997 fui eleito geral da Ordem e secretário geral para a formação e os estudos de toda a Ordem. Em 2003 me elegeram ministro geral da Ordem e foi reeleito para outros 6 anos em 2009.
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