segunda-feira, 7 de março de 2011

Campanha da Fraternidade 2011 - São Francisco e a criação


189. São Francisco é hoje um modelo para os que buscam uma relação mais qualitativa em relação às criaturas, pois cresce a consciência de que há relações que as degradam, acarretando também a degradação do ser humano. Existe uma interrelação entre o ser humano e as criaturas, como soube expressar São Paulo:

"De fato, toda a criação espera ansiosamente a revelação dos filhos de Deus; pois a criação foi sujeita ao que é vão e ilusório, não por seu querer; mas por dependência daquele que a sujeitou. Também a própria criação espera ser liberta da escravidão da corrupção, em vista da liberdade que é a glória dos filhos de Deus. Com efeito, sabemos que toda a criação, até o presente, está gemendo como que em dores de parto" (Rm 8,19-22). 

190. Por atitudes de arrogância e autosuficiência dos homens exploraram exaustivamente a natureza e a destruíram, depredaram, aniquilaram, extinguiram espécies e poluíram o ar e as águas. Assim, não foram respeitosos ao Criador que ao ser humano reservou a função de cuidar do seu jardim e de todas as criaturas.(100)'" Nesse sentido, é necessário que se desenvolvam novas atitudes para com a criação que se constitui em um dom de nosso Deus Criador.

191. Em relação à posse, esta relação é também muito perigosa, pois pela posse, o detentor de poder desqualifica o significado ou identidade dos seres em geral, entendendo-os como meros objetos para servir à intenção ou à necessidade de quem os possui. São Francisco soube contemplar e valorizar as coisas pelo que eram e pelo valor mais profundo que apresentavam como criaturas de Deus. (101)

192. O uso das criaturas para o nosso sustento e sobrevivência é imprescindível e se o homem foi colocado como o zelador das coisas, de outro, também é verdade que tudo lhe ficou à disposição. O problema está no uso indiscrimínado, na gastança desmedida, no consumismo desenfreado, muitas vezes de coisas supérfluas. É necessário resgatar a sobriedade no consumo dos bens necessários à dinâmica da vida e evitar desperdícios. São Francisco soube cultivar esta sobriedade no uso das criaturas, como podemos ver no fato de mandar o lenhador cortar apenas os galhos secos das árvores para que continuassem produztndo. (102)

193. A transformação está ligada ao trabalho, à atividade mediante a qual os seres humanos operam transformações de materiais ou de seres em outras realidades segundo sua intenção e necessidade. Hoje vemos que as transformações muitas vezes somente vão atender à necessidade de se manter ativa a roda do consumismo, com a produção do supérfluo. No entanto, esta atividade deve visar à vida e à sua justa manutenção.

194. Resgatar São Francisco neste contexto de nossas relações com as criaturas da natureza significa valorizar suas atitudes. Primeiramente, a pobreza, que neste santo significou a não-posse, reverteu-se em redenção para as criaturas, e lhe possibilitou pelo olhar contemplativo alcançar o que eram realmente, a ponto de lhes chamar de irmãs e irmãos. A razão é simples, em última análise este olhar purificado de poder e lucro, revela que as criaturas são dom de Deus e também portam sinais do Criador.

195. Por isso, São Francisco purificado interiormente pela ação do Espírito que o conduziu a renúncias, como posse e dominação, ao contemplar a natureza, nela somente via reflexos da imagem de Deus, de sua bondade e beleza. Assim, as criaturas não se constituem em obstáculos para se encontrar Deus e amá-lo. (103) 

196. Assim, a contemplação deste santo não era pautada simplesmente pelo fator racional, mas se deixava levar pelos seus sentimentos, por sua sensibilidade, até o ponto de realmente amar as criaturas, afinal, havia feito a descoberta de que elas eram também suas irmãs. Em consequência, nele brotou um respeito impressionante por todos os seres criados e soube viver de modo perfeitamente integrado a este universo, numa grande fraternidade com todo o universo criado por Deus. São Francisco, disse um de seus biógrafos, descobriu os segredos do coração das criaturas, às quais chamava de irmãs, porque já parecia gozar a liberdade gloriosa dos filhos de Deus. (104)

197. Que a oração em que São Francisco louva a Deus pelas criaturas, nos inspire novas atitudes e nos ajude a ser transformados pelo Espírito de Deus de modo a resgatarmos atitudes de quem cultiva e cuida do seu jardim, esta obra maravilhosa, que hoje requer socorro dos autênticos filhos de Deus, e de todos aqueles que empreendem ações sinceras e despojadas em prol do planeta.

100 - Cf. Celso Márcio Teixeira. Visão franciscana das criaturas.
In Perspectivas para uma nova Teologia da Criação, p. 274
101 - Cf. Ibidem, p. 275
102 - Cf. Ibidem
103 -  Cf. Ibidem, p. 276
104 - Cf. Ibidem, p. 277-278

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